resistencia

Tuesday, June 20, 2006

UMA TERCEIRA VIA?


Vão aqui alguns apontamentos, preparados para a última reunião do grupo do MCE da Escoala Domingues Sequeira, reunião que, afinal, não se realizou. Eu tinha-lhes prometido uma terceira via para a questão do ser ou não ser católico praticante. Deixo aqui os apontamentos, tendo como ilustração uma fotografia que sugere o quadro onde decorre a maior parte da nossa vida. E deixo-os com muita amizade e alguma saudade: vai-me fazer falta aquela juventude ruidosa e radiosa. Gostaria de ter falado do assunto directamente, pois assim seria mais fácil desfazer dúvidas e desenvolver o tema. Mas fico à disposição para quem quiser dar ou pedir esclarecimentos. Ou discutir...

A TERCEIRA VIA

A terminologia é de tal modo aceite, que muitos católicos aceitam com toda a naturalidade classificar-se a si próprios de católicos praticantes ou não praticantes, consoante os casos.
Será que existem, de facto, do ponto de vista do empenhamento evangélico estas duas categorias de católicos?

(A pergunta poderia fazer-se, de um modo geral, em relação a qualquer crente, pelo menos, cristão, judeu ou muçulmano.)

A resposta a que dou o nome de terceira via, baseada numa reflexão de muitos anos sobre os conceitos e a psicologia das pessoas que usam os termos praticante/não praticante, começa por pôr em realce o formalismo escondido por detrás de tal classificação. Formalismo que é o vírus mais perigoso de todas as religiões e contra o qual o Novo Testamento é portador das mais fortes invectivas.

E começo por distinguir FÉ de RELIGIÂO: é sobretudo nesta que se mete o formalismo. Formalismo que existe tanto na prática religiosa, como na sua ausência.

Ser cristão (ser católico) é, antes de mais e acima de tudo, ter uma fé, com os seus elementos objectivos, bem entendido (crer nisto ou naquilo), mas que corresponde sobretudo a uma adesão vital a Deus, que se revela em Jesus Cristo. Como tal, a fé é um dom absolutamente gratuito, infundido, com a esperança e a caridade, no momento do Baptismo, mas que se deve desenvolver à medida que se desenvolve a própria vida, com o esforço pessoal e com a ajuda directa e indirecta de Deus.
Nisto consiste a essência do ser cristão (católico).
Em meu entender, todo o baptizado que, segundo a sua condição específica (idade, sexo, estado, cultura, profissão, economia, nível social, saúde, etc), procura levar por diante aquela adesão vital, mesmo que uma vez por outra não o consiga, pode dizer-se católico praticante.
Aquilo que habitualmente se usa para classificar um católico de praticante/não praticante, ou seja, de um modo geral, a assiduidade a certas práticas religiosas é, de facto, muito importante, mas unicamente para ajudar aquela adesão vital. O crente que se esforça por viver coerentemente essa adesão descobrirá, não só a importância e necessidade das práticas oficiais, mas de outras, que o próprio Deus em que acredita e ao qual vai buscar a luz de que precisa para a sua vida concreta lhe inspirará.

Incluirá isto a sugestão de um caminho fácil?
É evidente que não.
Muito pelo contrário: Para o que se aponta é para uma maior responsabilidade; em primeiro lugar dos educadores da fé, a começar pelos pais, que, se não pediram o baptismo para os filhos por mero formalismo, sabem que eles adquiriram com Deus uma relação vital que tem de se desenvolver ao ritmo da vida física e cultural.
Depois dos próprios crentes, que, precisamente porque não querem viver fechados em puros formalismos, cuidam de formar bem a sua fé, de ser crentes adultos – que assumem os seus gestos, sem se escudar em atitudes de terceiros - e esclarecidos, isto é, sabem ou procuram saber distinguir o que, no seio da comunidade crente, é verdade indiscutível e o que é simples opinião.
Assim, é fácil perceber que, crente ou se é ou não se é. Independentemente da prática ou da ausência dela.

Monday, June 05, 2006

SANTA SÉ E VATICANO

Apresentar, em espaço que se possa considerar razoável num blogue e aceitável para a maioria dos que me visitam, a distinção/confusão entre Vaticano e Santa Sé, não me parece fácil… diria mesmo impossível.
Como, porém, a amizade manda muito, às vezes até mais do que certos escrúpulos de perfeição científica e estilística, deixo aqui, a pensar sobretudo no meu caríssimo Abílio Lisboa, algumas notas, ficando à espera de oportunidade para uma resposta mais cheia, digamos assim.
De um modo geral, poderíamos dizer que a Santa Sé é o Papa, com os órgãos de governo de que dispõe como cabeça do Colégio Apostólico; digamos, em linguagem mais profana, como Chefe da Igreja Universal. Corresponde, “grosso modo”, à Cúria, nas dioceses. Aliás, também se usa o termo Cúria Romana, com o significado de Santa Sé. Não esquecer, no entanto, que o Papa é cabeça da Igreja porque é bispo de Roma: e como tal tem a sua cúria, que, como é fácil de entender, mesmo para quem sabe pouco Direito Canónico, não se pode confundir com a Santa Sé, no sentido explicado acima.
E o Vaticano?
Geograficamente, o Vaticano é uma das sete colinas cantadas pelos poetas clássicos de Roma. Na sua história ligada ao cristianismo, começou por ser o local onde a tradição venerava a memória do martírio e da sepultura de Pedro.
Longe de ser o local preferido pelos papas para sua morada, foi, no entanto, após Constantino, um ponto de mira dos grandes construtores, por devoção ou vaidade, sobretudo a partir do Renascimento.
Daí a grandiosidade da Basílica de São Pedro, que nem sequer é a Sé de Roma, e dos edifícios que a rodeiam.
As muralhas, construídas no século IX por Leão IV, mais tarde aumentadas por Alexandre VI, em pleno Século XVI, ofereciam um refúgio seguro ao Papa, quando vinham inimigos de fora, ou o povo se amotinava contra ele.
Foram também uma boa sugestão para Pio IX, que, quando as tropas de Vítor Manuel II, comandadas por Garibaldi, se aproximavam de Roma, na qual entraram a 20 de Setembro de 1870, abandonou o palácio do Quirinal e se refugiou no palácio do Vaticano.
Mas o que deu uma nova importância a seta colina foram os Acordos de Latrão, assinados em 11 de Fevereiro de 1929, pelas delegações da Santa Sé e do Governo Italiano. Acordos que puseram fim à chamada Questão Romana, criada precisamente pela conquista de Roma por parte de Vítor Manuel II, rei do Piemonte, que, entretanto, se autoproclamara rei de Itália.
De facto, para garantir a independência política da Santa Sé – ou seja do Papa e dos seus órgãos de governo para Igreja Universal, foi criado o Stato della Cità del Vaticano (SCV) – o Estado da Cidade do Vaticano, com total autonomia política, em relação ao Estado Italiano. O Papa, além de bispo de Roma e, como tal, cabeça visível da Igreja de Cristo, é também o Chefe de Estado do Vaticano.
Fora do Vaticano propriamente dito, pertencem ao novo Estado, como seu território, os palácios das Congregações e os edifícios das embaixadas junto da Santa Sé.
Para não nos alongarmos mais:
Digamos que a Santa Sé é conjunto das instituições que ajudam o bispo de Roma no ministério petrino – o ministério confiado a Simão dentro do Colégio Apostólico, para o serviço de toda a Igreja – enquanto o Vaticano é a organização territorial e política que assegura a essas instituições a conveniente liberdade.
O que acontece é que hoje, devido à ignorância que campeia nos órgãos de comunicação social, se usa muitas vezes a palavra Vaticano, quando devia usar-se Santa Sé, ou, segundo uma norma recente, Sé Apostólica.
Acrescente-se a isto que o Papa, como bispo de Roma, não tem mais autonomia em relação ao Estado Italiano do que qualquer outro bispo daquele país.