UMA TERCEIRA VIA?
Vão aqui alguns apontamentos, preparados para a última reunião do grupo do MCE da Escoala Domingues Sequeira, reunião que, afinal, não se realizou. Eu tinha-lhes prometido uma terceira via para a questão do ser ou não ser católico praticante. Deixo aqui os apontamentos, tendo como ilustração uma fotografia que sugere o quadro onde decorre a maior parte da nossa vida. E deixo-os com muita amizade e alguma saudade: vai-me fazer falta aquela juventude ruidosa e radiosa. Gostaria de ter falado do assunto directamente, pois assim seria mais fácil desfazer dúvidas e desenvolver o tema. Mas fico à disposição para quem quiser dar ou pedir esclarecimentos. Ou discutir...
A TERCEIRA VIA
A terminologia é de tal modo aceite, que muitos católicos aceitam com toda a naturalidade classificar-se a si próprios de católicos praticantes ou não praticantes, consoante os casos.
Será que existem, de facto, do ponto de vista do empenhamento evangélico estas duas categorias de católicos?
(A pergunta poderia fazer-se, de um modo geral, em relação a qualquer crente, pelo menos, cristão, judeu ou muçulmano.)
A resposta a que dou o nome de terceira via, baseada numa reflexão de muitos anos sobre os conceitos e a psicologia das pessoas que usam os termos praticante/não praticante, começa por pôr em realce o formalismo escondido por detrás de tal classificação. Formalismo que é o vírus mais perigoso de todas as religiões e contra o qual o Novo Testamento é portador das mais fortes invectivas.
E começo por distinguir FÉ de RELIGIÂO: é sobretudo nesta que se mete o formalismo. Formalismo que existe tanto na prática religiosa, como na sua ausência.
Ser cristão (ser católico) é, antes de mais e acima de tudo, ter uma fé, com os seus elementos objectivos, bem entendido (crer nisto ou naquilo), mas que corresponde sobretudo a uma adesão vital a Deus, que se revela em Jesus Cristo. Como tal, a fé é um dom absolutamente gratuito, infundido, com a esperança e a caridade, no momento do Baptismo, mas que se deve desenvolver à medida que se desenvolve a própria vida, com o esforço pessoal e com a ajuda directa e indirecta de Deus.
Nisto consiste a essência do ser cristão (católico).
Em meu entender, todo o baptizado que, segundo a sua condição específica (idade, sexo, estado, cultura, profissão, economia, nível social, saúde, etc), procura levar por diante aquela adesão vital, mesmo que uma vez por outra não o consiga, pode dizer-se católico praticante.
Aquilo que habitualmente se usa para classificar um católico de praticante/não praticante, ou seja, de um modo geral, a assiduidade a certas práticas religiosas é, de facto, muito importante, mas unicamente para ajudar aquela adesão vital. O crente que se esforça por viver coerentemente essa adesão descobrirá, não só a importância e necessidade das práticas oficiais, mas de outras, que o próprio Deus em que acredita e ao qual vai buscar a luz de que precisa para a sua vida concreta lhe inspirará.
Incluirá isto a sugestão de um caminho fácil?
É evidente que não.
Muito pelo contrário: Para o que se aponta é para uma maior responsabilidade; em primeiro lugar dos educadores da fé, a começar pelos pais, que, se não pediram o baptismo para os filhos por mero formalismo, sabem que eles adquiriram com Deus uma relação vital que tem de se desenvolver ao ritmo da vida física e cultural.
Depois dos próprios crentes, que, precisamente porque não querem viver fechados em puros formalismos, cuidam de formar bem a sua fé, de ser crentes adultos – que assumem os seus gestos, sem se escudar em atitudes de terceiros - e esclarecidos, isto é, sabem ou procuram saber distinguir o que, no seio da comunidade crente, é verdade indiscutível e o que é simples opinião.
Assim, é fácil perceber que, crente ou se é ou não se é. Independentemente da prática ou da ausência dela.