resistencia

Thursday, August 17, 2006

SAUDADE E GARTIDÃO

Felizes os que habitam na vossa casa, Senhor;
Eles vos louvarão eternamente.

Soa o canto final, que pretende ser de alegria: a alegria da esperança, que, no dizer do Apóstolo, não engana, porque assenta na fidelidade do próprio Deus.
Mas em que medida um cântico final, marcado pela saudade e a despedida, que só para quem acredita e vê para além das aparências, não é definitiva, torna-se difícil dizê-lo.
Sinto-me mergulhado, mais uma vez, numa profunda orfandade: é que pais, verdadeiramente pais, quando fazemos da resistência à mediocridade a dinâmica da nossa existência, não encontramos muitos, ao longo da vida.
Olho o tecto da catedral, como que a procurar coragem para me fixar de novo na pregação daquela caixa que guarda os restos mortais do homem que mais marcas deixou na minha personalidade.
E dou-me conta de que, ainda aqui, me está a dizer o que mais apreciei no seu modo de estar entre os homens: para a frente, trabalhar, fazer o máximo, sem se preocupar com protagonismos de qualquer espécie.
Num país de medíocres, não vale a pena esperar que reconheçam o nosso valor, nem isso é importante. Talvez seja mesmo um sintoma de que estamos acima da média, o facto de não falarem de nós, a não ser por inveja.
Este funeral, de um homem que, sem favor, pode considerar-se figura de primeira grandeza, no nosso tão desertificado panorama intelectual, mas do qual, nem mesmo na Igreja, as pessoas parece terem-se dado conta, dá-me um enorme conforto, a mim, que não consegui, como sonhei um dia, ainda muito novo, imitar as qualidades que já então admirava no jovem professor recém-chegado de Roma.
Dá-me conforto, porque me ajuda a perceber onde estão os verdadeiros valores da vida, porque é ainda uma última lição do mestre que mais admirei ao longo da minha carreira humana, sacerdotal e académica.
Obrigado, Dom Américo, por mais esta lição.