LEGITIMIDADES
Claro. As palavras, porque instrumentos de comunicação e instrumentos inadequados, sofrem, não só dessa inadequação, mas também da história, tanto dos indivíduos como da comunidade que as utiliza.
Assim sendo, não vale a pena travar lutas quixotescas contra as marcas que nelas deixam os acidentes de percurso que marcam a vida política, cultural e religiosa dos falantes.
Mas não traria prejuízo nenhum à nação – tomo a palavra com todos os sentidos que tem nesta parte do mundo em que nos calhou viver – que as pessoas, ao utilizar certos termos, pensassem um pouco no seu significado real, que nem sempre dispensa algumas noções de história da língua.
Assaltam-me estes pensamentos a propósito de muita coisa; mas gostaria de deter-me um pouco sobre aquilo que querem significar os políticos e os seus críticos, quando dizem que o Governo tem legitimidade para legislar sobre isto ou sobre aquilo.
Ainda que numa verdadeira democracia não seja o Governo, mas o Parlamento, que detém o poder legislativo.
Se legítimo é aquilo que está segundo a lei – alguns preferem dizer que o que está segundo a lei é lícito, esquecendo mais ma vez a força da história – e o que dá legitimidade a um Governo é lei do voto, é evidente que o Governo que é apoiado pela maioria dos votos tem legitimidade para legislar sobre qualquer assunto que não lhe tenha sido retirado pela própria Constituição.
Em minha opinião, perguntar se o Governo ou o Parlamento têm legitimidade para legislar sobre um assunto, partindo da natureza do assunto, é, pelo menos perder tempo, já que as matérias subtraídas ao poder legislativo não dependem directamente da sua natureza, mas do seu tratamento pelo Constituição.
O pior é que não se perde só tempo; em alguns casos, pelo menos, perde-se também a perspectiva: porque a legitimidade que permite fazer leis, não permite legislar de qualquer maneira, segundo esta ou aquela ideologia, para satisfazer este ou aquele grupo de pessoas.
Para não me alongar, vou buscar apenas um exemplo, algo de que se fala muito, talvez até em excesso, mas cuja problemática, no quadro da legitimidade legislativa, não vi ainda abordar numa perspectiva que levasse os detentores do poder a considerar que, mais do que interrogar-se sobre se é legítimo ou não de legislar, deveriam analisar com verdadeiro sentido ético se as leis que fazem legitimamente são antropologicamente legítimas.
O exemplo que trago é o do chamado casamento dos e das homossexuais:
Pessoalmente sou dos que defendem há muito uma intervenção do poder político nessa matéria. Não entro na discussão sobre a natureza da homossexualidade; mas tem-me preocupado o modo como o fenómeno se equaciona, com as hostes instaladas em dois campos irredutíveis, fazendo dele mais uma questão ideológica, arma de arremesso entre partidos, do que realidade humana a pedir um enquadramento legal que não discrimine ninguém: nem homossexuais nem heterossexuais.
Já agora, acrescento que chamar homófobo a um não homossexual é um insulto que só se tem admitido porque estamos num mundo em que, de facto, são as minorias que discriminam as maiorias.
Voltando à legitimidade do Governo ou do Parlamento para legislar sobre essa matéria, também penso que a tem.
Já não estou tão seguro de que tenham legitimidade para legislar como se preparam para fazê-lo.
Mas isso não se resolve com um referendo, salvo melhor opinião.
Assim sendo, não vale a pena travar lutas quixotescas contra as marcas que nelas deixam os acidentes de percurso que marcam a vida política, cultural e religiosa dos falantes.
Mas não traria prejuízo nenhum à nação – tomo a palavra com todos os sentidos que tem nesta parte do mundo em que nos calhou viver – que as pessoas, ao utilizar certos termos, pensassem um pouco no seu significado real, que nem sempre dispensa algumas noções de história da língua.
Assaltam-me estes pensamentos a propósito de muita coisa; mas gostaria de deter-me um pouco sobre aquilo que querem significar os políticos e os seus críticos, quando dizem que o Governo tem legitimidade para legislar sobre isto ou sobre aquilo.
Ainda que numa verdadeira democracia não seja o Governo, mas o Parlamento, que detém o poder legislativo.
Se legítimo é aquilo que está segundo a lei – alguns preferem dizer que o que está segundo a lei é lícito, esquecendo mais ma vez a força da história – e o que dá legitimidade a um Governo é lei do voto, é evidente que o Governo que é apoiado pela maioria dos votos tem legitimidade para legislar sobre qualquer assunto que não lhe tenha sido retirado pela própria Constituição.
Em minha opinião, perguntar se o Governo ou o Parlamento têm legitimidade para legislar sobre um assunto, partindo da natureza do assunto, é, pelo menos perder tempo, já que as matérias subtraídas ao poder legislativo não dependem directamente da sua natureza, mas do seu tratamento pelo Constituição.
O pior é que não se perde só tempo; em alguns casos, pelo menos, perde-se também a perspectiva: porque a legitimidade que permite fazer leis, não permite legislar de qualquer maneira, segundo esta ou aquela ideologia, para satisfazer este ou aquele grupo de pessoas.
Para não me alongar, vou buscar apenas um exemplo, algo de que se fala muito, talvez até em excesso, mas cuja problemática, no quadro da legitimidade legislativa, não vi ainda abordar numa perspectiva que levasse os detentores do poder a considerar que, mais do que interrogar-se sobre se é legítimo ou não de legislar, deveriam analisar com verdadeiro sentido ético se as leis que fazem legitimamente são antropologicamente legítimas.
O exemplo que trago é o do chamado casamento dos e das homossexuais:
Pessoalmente sou dos que defendem há muito uma intervenção do poder político nessa matéria. Não entro na discussão sobre a natureza da homossexualidade; mas tem-me preocupado o modo como o fenómeno se equaciona, com as hostes instaladas em dois campos irredutíveis, fazendo dele mais uma questão ideológica, arma de arremesso entre partidos, do que realidade humana a pedir um enquadramento legal que não discrimine ninguém: nem homossexuais nem heterossexuais.
Já agora, acrescento que chamar homófobo a um não homossexual é um insulto que só se tem admitido porque estamos num mundo em que, de facto, são as minorias que discriminam as maiorias.
Voltando à legitimidade do Governo ou do Parlamento para legislar sobre essa matéria, também penso que a tem.
Já não estou tão seguro de que tenham legitimidade para legislar como se preparam para fazê-lo.
Mas isso não se resolve com um referendo, salvo melhor opinião.