Wednesday, December 24, 2008

EFEMÉRIDE


Puccini
Vai para um mês que não apareço neste blog; não é falta de temas, mas de outras coisas, que não vou especificar aqui.
Para intimidades bastam uns parágrafos da página que escrevi no dia 22, 150º aniversário do nascimento de Puccini.
Aqui vão eles.

La Bohème, cenas finais: Mimi, consumida pela doença e a loucura da paixão, acolhe o sono da morte encostada ao peito de Rodolfo: La Bohème, Madame Butterffly, Tosca, Suor Angelica, Turandot... Puccini e o seu carinho pelas mulheres infelizes... Vem-me à lembrança a afirmação de João Paulo II, segundo o qual por detrás do sofrimento de uma mulher está sempre o pecado de um homem. E se falamos do sofrimento das mulheres, então, temos de pensar nos pecados dos homens.
Acontece, porém, que o contexto das palavras do Papa pode tornar-se algo redutor, se consideramos apenas o problema das relações entre as duas formas de existência humana, que Deus quis assim, uma para outra, mas cada uma com plenitude de significado cósmico.
A literatura ocidental, mesmo antes da sua penetração pela cultura judeo-cristã, diríamos que desde as tradições que produziram o mito de Orfeu e Eurídice, encontrou um filão inesgotável na temática da impossibilidade de realização plena da felicidade que sempre se busca na paixão amorosa: o amor que se realiza, morre, numa espécie de suicídio fatal.
Assim, o coração que mais ama, aquele que leva mais longe a lógica da entrega, corre maiores riscos de encontrar a infelicidade onde procura a felicidade.
Claro que não é uma fatalidade.
E, sem negar que estamos perante realidades demasiado complexas, que não se compadecem com análises simplistas, temos de concordar que quando Deus sai do horizonte das nossas vidas, elas se tornam mais limitadas e consequentemente mais trágicas, porque o que define a pessoa é o seu carácter relacional... e quando as nossas relações se encerram no espaço intra-mundano, ou se quebram as fronteiras ou nos destruímos.
Isto não tem que ver com a chamada violência doméstica.
A violência, que já vai sendo tempo de enquadrar nas suas verdadeiras dimensões, até porque corremos o risco de misturar na mesma panela ingredientes que, não sendo da mesma natureza, acabam por inutilizar o prato que certos feminismos pretendem servir nas conversas de café e nos areópagos da comunicação social.
Voltemos a Puccini, mesmo sem sacrificar a metafísica dos sentimentos:
No dia em que se celebram os 150 anos do seu nascimento, talvez fosse oportuno aproveitar a efeméride para fazer outras reflexões, como, por exemplo, aprofundar as dimensões antropológicas da sua música, dos grandes dramas da humanidade, que, como acontece com a guerra e todos os aleijões da nossa caminhada histórica, vitimam sempre quem, como a mulher e a criança, está mais perto das fontes da vida e, consequentemente, menos capacitado para abusar da força.

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