Tuesday, November 15, 2005

SER OU NÃO SER CRENTE

-É crente?
Uma pergunta que ouvi ainda hoje, naquela estação de rádio que sempre tomo como alternativa à confrangedora mediocridade das nossas emissoras, dos canais, todos os canais da nossa televisão… mas também o entrevistador deste programa, pretensamente cultural, achou que devia informar-se sobre a crença, ou ausência dela, no caso do seu entrevistado, ou entrevistada, porque se tratava de uma senhora, uma escritora espanhola que entrou na moda da literatura disfémica, que está a ser uma autêntica mina de ouro para as editoras.
A senhora respondeu como geralmente respondem os que tomam a sério essa pergunta, sem, no entanto se preocuparem com o essencial, que, em meu entender, seria o de esclarecer o verdadeiro significado da palavra crente.
Muito preocupada com a sua imagem, evitando uma resposta que despertasse nos “crentes” a suspeita de que não nutria respeito por eles, mas fornecendo ao entrevistador elementos suficientes para não a incluir entre aqueles que no fundo despreza.
Por uns instantes subiu-me à superfície da memória todo o cortejo de pessoas públicas que, ao ser-lhe dirigida tal pergunta, nos dão um triste exemplo de malabarismo, em busca de respostas que não comprometam demasiado… até porque, mais uma vez, dando à pergunta uma seriedade que não pode ter, ficam à mercê dos preconceitos que a inspiram.
Foi pensando nesse triste espectáculo que decidi sintetizar, para quem queira ver mais um aspecto da minha resistência ao nivelamento por baixo da nossa capacidade de pensar livremente, um artigo que encontrei numa revista espanhola que me chegou à mãos ontem.
Eis algumas das ideias aí expostas:

«Se um dia, na rua, alguém me perguntasse:
- O senhor é crente?
Com toda a sinceridade e com desejo de escandalizar um poucochinho, responderia:
- É claro que não.
Seria uma forma como qualquer outra, de dizer que sou católico, uma vez que nesta sociedade moderadamente pagã e laicista, nós cristãos distinguimo-nos dos que o não são, não tanto por aquilo em que acreditamos, como pelas coisas em que nos não apetece acreditar.
O paganismo é foi e é crente; é mesmo crédulo, supersticioso, idólatra, devotamente assustadiço diante das forças ocultas que imagina nos abismos das montanhas. (…)
Por outro lado, o laicismo, versão século XXI, criou um elenco interminável de dogmas politicamente correctos que se apresentam a si próprios como artigos de fé covil, se proclamam por todos os meios e cristalizam em frases-tópico que todo o bom democrata deve repetir de vez em quando e aceitá-las religiosamente se não quer ser anatematizado pelos inquisidores e mandado para as trevas da reacção e do fundamentalismo.
Por isso digo que não sou “crente” nem estou disposto a sê-lo.»
Quem tem ouvidos para ouvir ouça.
(Mundo Cristiano, nº 535, pg. 8)

9 Comments:

Anonymous Anonymous said...

I'm a believer!

2:50 AM  
Blogger Augusto Ascenso Pascoal said...

Me too! In sense that you say, I think...!
AP

3:07 AM  
Anonymous Anonymous said...

Não creio ser crente dessas crenças que a gente quer, à força, fazer crer.
Mas esta "posta" deu para perceber quão estúpida é a pergunta "é crente?"! Mas também já estamos habituados a futilidades jornalísticas...

7:10 AM  
Anonymous Anonymous said...

Já agora, espero que me dê livença para publicar esta posta no moleskine...

7:10 AM  
Blogger Augusto Ascenso Pascoal said...

Toda, meu caro!
Mas talvez ainda voltemos ao assunto.
Um abraço
AP

2:56 PM  
Anonymous Anonymous said...

Já estamos habituados a futilidades de facto... não só jornalísticas! Talvez o jornalismo seja apenas um reflexo de muitas outras futilidades que nos enchem o dia-a-dia. Talvez se distinga das demais pelo grau de exposição!

6:52 PM  
Anonymous Anonymous said...

ora aí está um profissional na defesa da classe! :) e com (muita) razão... é sempre um risco confundir as profissões com as pessoas que a exercem.

5:38 AM  
Anonymous Anonymous said...

Já começo a perder a fé de ver alguma novidade por aqui.
Faça resistência!!!

9:37 AM  
Blogger Augusto Ascenso Pascoal said...

Está para breve.

3:21 PM  

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