O TESPOURO DO TEMPO
Para a Guida, que me enviou o texto seguinte:
A vida em contra-relógio...
«Um relojoeiro estava a concertar o pêndulo de um relógio. E eis que, para sua surpresa viu que o pêndulo tomou a palavra para dizer:
- Por favor, senhor relojoeiro, não me conserte. Seria um acto de amabilidade da sua parte. Imagine só o número de vezes que tenho de fazer tic-tac dia e noite...
Imensas vezes cada minuto aumenta os sessenta minutos que tem a hora, vinte e quatro horas por dia, trezentos e sessenta e cinco dias ao ano. É assim um ano após outro... Se me conserta, imagine os milhões de “tic-tac” que tenho de fazer. Não consigo suportar tanta monotonia.
O relojoeiro, que escutou atentamente, respondeu com sabedoria:
- Não penses no futuro, limita-te a fazer um “tic-tac” de cada vez e gozarás de cada “tic-tac” durante o resto da tua vida.
O pêndulo aceitou o conselho do relojoeiro e ainda hoje continua a fazer plenamente cada “tic-tac” como se fosse o único.
In “Boas Noites” (Pedrosa Ferreira)
Vivemos num tempo marcado pela velocidade, com tudo o que isto implica de avanços e retrocessos ao nível da qualidade de vida das pessoas e da sociedade em geral. Parece que já não sabemos viver de outra forma. A vida tomou-se uma corrida contra o tempo, um contra-relógio alucinante em que, sem nos darmos conta, vamos gastando as horas e os dias numa maratona interminável sempre em busca da última novidade que, quando a atingimos, já deixou de ser novidade, porque já está ultrapassada.
Não temos tempo para saborear a vida com os seus encantos e beleza, com o seu significado e transcendência, com a sua profundidade e valor. Ainda não digerimos o momento presente e já estamos a pensar no amanhã, porque é preciso não deixar fugir o futuro com o que isso implica de novidade e atracção. Corremos o risco de viver sempre no futuro sem apreciar os encantos do presente. Somos máquinas de reciclagem do tempo que não chegam a apreciar o que adquirem, porque é preciso estar a par do cronómetro que já se encarregou de criar novas ilusões que facilmente fazem esquecer aquilo que se conseguiu com tanto suor. Somos um produto da máquina que construímos em vez de sermos nós a comandá-la. Somos instrumento daquilo que fabricamos e não vemos maneira de fugir, porque temos medo de descarrilar da engrenagem que nos enjaula em nome dum progresso e duma liberdade falaciosas.
O monstro do futuro que nos promete felicidades sempre adiadas é o mesmo que nos vai retirando a verdadeira felicidade que não se vive no amanhã, mas no agora, porque quem não vive o presente, não vive, pois o futuro não se vive, apenas se sonha. E, nesta roda viva em que nos sentimos atordoados, não encontramos uma porta de saída, porque o círculo vicioso da procura faz-nos regressar sempre ao mesmo ponto de partida que deixa de ser linear para ser circular.
Perdemos o sentido da liberdade que nos vem da autonomia do pensamento, de sermos construtores e protagonistas da nossa história edificada com alicerces firmes dum ontem que foi avaliado para gerar frutos amadurecidos de modo a serem saboreados no hoje e poderem gerar substrato para um amanhã de certeza e não de medos que atrofiam e amesquinham.
Precisamos de viver o tempo e não gastar o tempo, precisamos de sentir a vida e não arrastar-nos pela vida. Só tem medo do futuro quem não vive o presente, porque é no hoje da nossa existência que nós temos que nos sentir vivos e realizados. O presente é exactamente “um presente” que nos é oferecido em cada momento como dom de Deus a convidar-nos ao encantamento e à felicidade. Precisamos de saber aproveitar esta benção de olhar optimista que se projecta para o alto em gesto agradecido e não de olhar derrotado e desesperante como quem não vê além da biqueira do sapato, numa corrida em busca do vazio.
O momento presente deve ser sempre um espaço de louvor agradecido ao Senhor do tempo que no-lo dá para viver, saboreando cada “tic-tac” da vida, sem contar os “tic-tac's” que poderemos ou não viver, porque quem vive cada segundo com verdadeiro significado, para esse o tempo não conta, pois cada momento sabe a eternidade!
Saibamos aproveitar o tempo valorizando-nos a nós mesmos, valorizando o encanto desta maravilha que é o paraíso que Deus criou para nós, valorizando os relacionamentos humanos que nos fazem sentir mais pessoas, tudo isto num hino agradecido Àquele que nos ensina a “viver” e não a sobreviver.
No “tic-tac” da vida há sempre um Relojoeiro a apreciar o ritmo silencioso, mas certeiro, com que roda cada segundo do relógio do “presente” que colocou na nossa mão.
In “Sê!” (Pe. José Augusto)
Comentários para quê?
Permito-me apenas acrescentar mais um texto de um autor espiritual dos nossos dias, a quem devo muito e que já foi canonizado:
Não existem datas más ou inoportunas. Todos os dias são bons para servir a Deus. Só surgem os maus dias quando o homem os desaproveita com a sua falta de fé, com a sua preguiça, com a sua inércia, que o inclina a não trabalhar com Deus e por Deus. (…) O tempo é um tesouro que passa, que se escapa, que corre pelas nossas mãos como a água pelas penhas altas. Ontem já passou, e o dia de hoje está a passar. Amanhã será bem depressa outro ontem. A duração de uma vida é muito curta. Mas, quantas coisas se podem realizar neste pequeno espaço, por amor de Deus!
4 Comments:
E contudo não se pode perder tempo.
A que velocidade devemos andar então?
Julgo que o objectivo de todos será absorver o máximo num curto espaço de tempo, sem preder, claro, o disfrute do aqui e agora (e sem perder, claro, os outros no caminho).
Tão depressa se passa de um passar pelo tempo a correr, como deixar o tempo passar (desperdiçar o tempo com trivialidades ou deter-me em coisas que poderão não valer tanto tempo deter)
Acho que o tempo acabou de ultrapassar o estado cronológico.
:-D
Ih! Caro Migo! Nem parces tu... A tua reflexão, desta vez, vai em busca da profundiade. S eu tiver temo ainad hei-de tenatr um certo comple mento
Para ser mais claro. A tua reflexão sugere-me que procure tempo para continuar a dizer o que penso sempre esta preciosa moeda que recebemnos de Deus para comprar a etreniadde.
Um abraço
AP
Faça isso, caro amigo. Vá dizendo sempre o que pensa e escrevendo ou transcrevendo textos como o do relojoeiro. Faz-nos bem lê-los apesar de, às vezes, nem termos tempo de ouvir o tic-tac...
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