Monday, March 20, 2006

À SOMBRA DO CASTELO II



Continuo à sombra do castelo, olhando a cidade lá em baixo, agora ainda menos acolhedora, devido às obras de maquilhagem levadas a cabo pelo programa pólis.
Menos acolhedora, cada vez menos humana, porque as pessoas continuam a confundir desenvolvimento com crescimento, agravando, nas margens do Lis, as consequências de um progresso que tem vindo a perder a alma. E uma cidade sem alma não pode contribuir para o bem-estar real das pessoas.
E o que parece ser para servir o homem está, de facto, na maior parte dos casos, ao serviço do egoísmo, individual e colectivo. Vem-me à memória a afirmação daquele sociólogo denunciando o facto de, no mundo ocidental, as pessoas que custam mais dinheiro à família e à sociedade são os velhos e as crianças: estas porque todos as querem, aqueles porque ninguém os quer. Isto é, o que se paga não é a qualidade de vida de idosos e crianças, mas os egoísmos de quem não é nem idoso nem criança.
E digam lá se isto não é precisamente o que se descobre na parte final dessa parábola cruel que é sem dúvida a Metamorfose de Kafka?

Isto traz-me à memória as recomendações da encíclica Deus caritas est, da qual transcrevo dois parágrafos:

Todos os que trabalham nas instituições caritativas da Igreja devem distinguir-se pelo facto de que não se limitam a executar habilidosamente a acção conveniente naquele momento, mas dedicam-se ao outro com as atenções sugeridas pelo coração, de modo que ele sinta a sua riqueza de humanidade.
Só se contribui para um mundo melhor, fazendo o bem agora e pessoalmente, com paixão e em todo o lado onde for possível, independentemente de estratégias e programas de partido. O programa do cristão — o programa do bom Samaritano, o programa de Jesus — é «um coração que vê». Este coração vê onde há necessidade de amor, e actua em consequência.

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